Como já é de conhecimento de todos os empregadores da área da saúde, o Supremo Tribunal Federal (STF) assim decidiu nos autos da ADI 7222/DF quanto à implementação do Piso da Enfermagem previsto na Lei nº 14.434/2022 (com grifos nossos):

(i) em relação aos servidores públicos civis da União, autarquias e fundações públicas federais (art. 15-B da Lei nº 7.498/1986), a implementação do piso salarial nacional deve ocorrer na forma prevista na Lei nº 14.434/2022;
(ii) em relação aos servidores públicos dos Estados, Distrito Federal, Municípios e de suas autarquias e fundações (art. 15-C da Lei nº 7.498/1986), bem como aos profissionais contratados por entidades privadas que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS (art. 15-A da Lei nº 7.498/1986): a) a implementação da diferença remuneratória resultante do piso salarial nacional deve ocorrer na extensão do quanto disponibilizado, a título de assistência financeira complementar, pelo orçamento da União (art. 198, §§ 14 e 15, da CF, com redação dada pela EC nº 127/2022); b) eventual insuficiência da assistência financeira complementar mencionada no item (ii.a) instaura o dever da União de providenciar crédito suplementar, cuja fonte de abertura serão recursos provenientes do cancelamento, total ou parcial, de dotações tais como aquelas destinadas ao pagamento de emendas parlamentares individuais ao projeto de lei orçamentária destinadas a ações e serviços públicos de saúde (art. 166, § 9º, da CF) ou direcionadas às demais emendas parlamentares (inclusive de Relator-Geral do Orçamento). Não sendo tomada tal providência, não será exigível o pagamento por parte dos entes referidos no item (ii); c) uma vez disponibilizados os recursos financeiros suficientes, o pagamento do piso salarial deve ser proporcional nos casos de carga horária inferior a 8 (oito) horas por dia ou 44 (quarenta e quatro) horas semanais, vencidos os Ministros Edson Fachin e Rosa Weber.
(iii) em relação aos profissionais celetistas em geral (art. 15-A da Lei nº 7.498/1986), a implementação do piso salarial nacional deverá ser precedida de negociação coletiva entre as partes, como exigência procedimental imprescindível, levando em conta a preocupação com demissões em massa ou prejuízos para os serviços de saúde. Não havendo acordo, incidirá a Lei nº 14.434/2022, desde que decorrido o prazo de 60 (sessenta) dias, contados da data de publicação da ata deste julgamento […] Quanto aos efeitos da presente decisão, em relação aos profissionais referidos nos itens (i) e (ii), eles se produzem na forma da Portaria GM/MS nº 597, de 12 de maio de 2023, vencidos os Ministros Dias Toffoli, Luiz Fux, Nunes Marques e Alexandre de Moraes. Tudo nos termos do voto conjunto do Ministro Luís Roberto Barroso (Relator) e do Ministro Gilmar Mendes. Proclamação realizada pelo Ministro Luís Roberto Barroso, Vice-Presidente no exercício da Presidência.

O processo da ADI 7222 está concluso com o relator, Min. Roberto Barroso, para análise dos diversos Embargos de Declaração opostos pelas entidades interessadas para aclarar a matéria. Dentre as matérias a serem apreciadas, estão: (i) a base a ser considerada para aplicação do piso: se o salário do trabalhador ou sua remuneração global; (ii) a natureza do pagamento complementar a ser pago pelas entidades filantrópicas com recursos do Fundo Nacional de Saúde; (iii) quais os pressupostos da negociação coletiva prévia, requisito procedimental indispensável que o STF estabeleceu para o cumprimento do piso. Tais itens foram adequadamente levantados pela Confederação Nacional da Saúde e por outras entidades representativas integrantes do processo.

Além dos itens acima, outras questões também estão sendo suscitadas em sede de Embargos Declaratórios, até mesmo pelas entidades que representam os trabalhadores, como a referência da carga horária de 44h semanais. A Federação Nacional Dos Enfermeiros – FNE – expressamente busca a desvinculação do piso legal à jornada de trabalho (44 horas semanais).

Assim, para que haja a aplicação correta do piso da enfermagem é necessário que o STF se manifeste quanto às questões acima mencionadas, que serão decididas por ocasião do julgamento dos Embargos Declaratórios, nos autos da ADI 7222/DF. Nesse sentido, recomendamos prudência às entidades empregadoras privadas quanto à tomada de decisão pela aplicação imediata do piso salarial, ainda que a postergação de tal medida, após a fixação dos referidos critérios pendentes de definição na Suprema Corte, possa ensejar futura determinação de pagamento retroativo da nova base salarial.

Entendemos que, caso haja decisão de gestão pelo pagamento imediato do piso, antes mesmo do julgamento acima referido, face o transcurso dos 60 (sessenta) dias estabelecido no Acórdão, é prudente que as entidades empregadoras privadas adotem como referência, a título de observância do piso, o valor da remuneração global de seus empregados, e não os salários nominais. Isso porque, caso assim venha a decidir o STF, futuramente haverá significativo risco trabalhista quanto à reversão de valores e critérios de pagamento (eventual caracterização de alteração contratual lesiva, o que é vedado pela CLT – art. 468 da CLT).

Por fim, no que diz respeito às entidades beneficiárias dos recursos do Fundo Nacional de Saúde, igualmente haverá necessidade de manifestação do STF quanto aos termos dos embargos declaratórios na ADI nº 7222/DF. De qualquer sorte, recomenda-se que estas entidades realizem o pagamento dos valores do piso sob a rubrica de “diferença de piso indenizatório”, em verba complementar, nos limites dos recursos recebidos.

Estamos à disposição para maiores esclarecimentos,

BENÔNI ROSSI – OAB/RS 43026

Advogado do escritório RMMG Advogados